Bolsonarismo: dissonância cognitiva coletiva
O que diz uma teoria da psicologia sobre profecias flopadas
Há quatro anos Bolsonaro dá a senha para a barbárie de 8 de janeiro, em Brasília. Bolsonaro falou em fuzilar adversários. Dilapidou a confiança no sistema eleitoral. Incitou o ódio contra ministros do STF. Criou a ideia de que as Forças Armadas seriam um poder mediador. Disse que não aceitaria o resultado das eleições. Ameaçou um golpe de Estado. Mesmo assim, depois da invasão e destruição do Palácio, do STF e do Congresso, há bolsonaristas colocando a culpa em “infiltrados” e levantando novas teorias conspiratórias ainda mais alienadas. Loucura ou má-fé?
No episódio “72 horas” do podcast Rádio Novelo Apresenta, publicado em 5 de janeiro, a Flora Thomson-DeVeaux dedica o primeiro bloco a entender como seitas conseguem continuar de pé quando suas profecias falham – e elas sempre falham, seja o bug do milênio ou a intervenção militar que forçaria a volta de Bolsonaro à presidência. O professor João Cezar de Castro Rocha, da UERJ, fala no podcast e propõe dois conceitos pra entender a “seita” bolsonarista: a “dissonância cognitiva coletiva” alimentada pela “midioesfera extremista”. Explico…
Dissonância cognitiva é quando você diz uma coisa e faz outra. Quase todos fazemos isso em maior ou menor grau. Ultimamente, vários deles (beeem afetados) se organizaram politicamente: o “cidadão de bem” que trai e bate na mulher, o cristão armamentista, o empresário anti-corrupção que sonega imposto, e outros. Quando a dissonância torna-se muito acentuada, produz um desconforto psicológico que procuramos diminuir. Como? Por exemplo, se cercando de informação falsa que confirme o seu comportamento. Como os algoritmos incentivam a formação de bolhas informativas, é fácil achar onde confirmar sua insensatez.
O que seria a rede de informação bolsonarista se não um laboratório de realidade paralela? Foi essa usina de fake news que levou sua família a acreditar em mamadeira de piroca, em plantações de maconha em universidades, em fraudes nas urnas eletrônicas, em um messias. Há casos em que a dissonância cognitiva pode produzir até prazer. Prazer em achar que você tem uma informação privilegiada, um conhecimento único. É só notar aquele risinho de canto de boca no vídeo de vários malucos falando as teorias mais estapafúrdias, claramente mentirosas.
Nos estudos sobre seitas percebe-se que, quando as profecias furam, em vez de os seguidores fazerem uma autocrítica e perceberem que caíram num conto do vigário, elas “racionalizam o fracasso”, adiam a profecia, e dobram a aposta. Mergulham na midioesfera extremista e voltam de lá com uma nova teoria, um novo prazo, as convicções absurdas renovadas. Bolsonaro passou seu mandato descumprindo ameaças que prometeu a seus seguidores. A essa altura já fugiu para Orlando. Mas seus fanáticos seguem inventando desculpas, teorias, novos prazos. Racionalizam o fracasso e dobram a aposta. Invadem o Congresso e inventam "infiltrados".
João Cezar de Castro Rocha diz no podcast: “Quando nós dizemos assim: "são todos loucos", é um equívoco da nossa parte. Eles não são loucos, eles estão, eles são reféns da midiosfera extremista. Milhares de pessoas estão diante de quartéis pedindo ditadura militar. Mas não o fazem porque sejam pessoas intrinsecamente más, organicamente fascistas. É uma falta de compreensão do fenômeno”. "Reféns de um sistema que dá pra regular, dá pra intervir. Mas não é simples. Alexandre de Moraes que o diga. Por um lado, tem a intervenção. Mas antes disso, a própria compreensão do fenômeno já ajuda”, a Flora conclui.
Ouçam Rádio Novelo Apresenta em todas as plataformas de podcast. E conheçam a cabeça dos extremistas vendo a série que roteirizei: Extremistas.br, na Globoplay.
Oi. Fiz a assinatura, mas quase não há conteúdo.....