Risada de galinha, a loira errada, doida: como descrevem as mulheres na política.
Lugar de mulher é onde ela quiser.
Desde sempre e (infelizmente) ainda hoje as mulheres enfrentam todo tipo de violência de gênero (quando a violência é contra a mulher por ser mulher) na política. E o caldo dessa cultura começa com comentários que estereotipam as mulheres. Alguns exemplos:
Em 19 de julho de 2007, a então senadora Hillary Clinton subiu à tribuna do Congresso americano para falar dos custos da educação superior. No dia seguinte, o jornal The Washington Post publicou uma reportagem dedicada ao decote – quase insignificante, aliás – que ela exibiu durante o discurso. “Foi surpreendente notar um quê de sexualidade e feminilidade dando as caras no ambiente esteticamente conservador do Congresso”, escreveu Robin Givhan, que acrescentou: “Foi ainda mais surpreendente constatar que isso partia da senadora Clinton”.
Hillary não foi a primeira nem a única, claro. Em 1998, Irene Sáez não foi levada a sério pela imprensa venezuelana em sua disputa com Hugo Chávez pela presidência porque além de prefeita de Chacao e governadora de Nueva Esparta tinha sido Miss Universo quando jovem. “Não votarei em Irene Sáez porque não é meu tipo de loira”, escreveu o colunista Ibsen Martínez no jornal El Universal.
Voltando a Hillary: apesar de ter sido importantíssima no governo do marido Bill Clinton (“Foi ela quem muitas vezes canalizou suas energias, guiou-o para o sucesso e salvou-o de si mesmo”, diz um perfil no NYTimes), nunca deixou de ser vilipendiada. Já foi chamada até por ditos analistas políticos de “vadia branca” e “castradora”. Não bastasse, implicaram com sua risada. “Cacarejo de galinha – algo típico das bruxas”, disparou Joan Vennochi no The Boston Globe.
Na Argentina, outro exemplo. Em 2007, ao analisar a campanha de Cristina Kirchner na Argentina, Jennifer Piscopo – especialista em estudos de gênero e representação feminina na América Latina – observou que, por um lado, se cobra feminilidade das candidatas mulheres. Mas, por outro, acredita-se que a vaidade sinaliza futilidade. Para que possam competir com candidatos homens, exige-se delas certa assertividade. No entanto, se ficam um tom acima, são consideradas descontroladas. Erradas elas ou quem as analisa?
E como se esquecer de quando Dilma Rousseff foi colocada na capa da IstoÉ como alguém que perdeu o “equilíbrio e as condições emocionais para conduzir o país”, sendo comparada a Dona Maria, a Louca. A certa altura da reportagem, lê-se: “Para tentar aplacar as crises, cada vez mais recorrentes, a presidente tem sido medicada com dois remédios ministrados a ela desde a eclosão do seu processo de afastamento: rivotril e olanzapina, este último usado para esquizofrenia, mas com efeito calmante. A medicação nem sempre apresenta eficácia, como é possível notar”.
A violência política de gênero vai de piadinhas a assédio, de censura a assassinatos. É um fenômeno mundial, ainda que varie em forma e grau. Ao tentar limitar o papel de Janja no governo de Lula, reforça-se que mulheres têm papeis pré-definidos pela sociedade. E se isso sai da boca de outra mulher é igualmente machismo. Porque falta consciência de gênero a muitas mulheres, inclusive algumas eleitas. Nem toda mulher é pró-mulher.
A solução? Ocupar tudo, ocupar cada vez mais até que a ninguém mais ocorra dizer a uma mulher que ela não pode estar onde quer estar. Minha frase favorita sobre mulheres na política é da ex-presidente Michele Bachelet: uma mulher na política muda a própria mulher, mas muitas mulheres na política muda a política.
Como tratam as mulheres na política é um reflexo de como nos tratam no dia-a-dia: tentam nos coibir e limitar à papéis que sirvam à agenda conservadora do patriarcado. No fundo, sabem do nosso poder, principalmente quando nos unimos. As mulheres foram essenciais na eleição de Lula. É um recado que não queremos ser bibelô, mas agentes da mudança com um lugar à mesa. Não arredaremos o pé :)
fora que essa foto da dilma era em um jogo de futebol. e que alegria uma newsletter sua!